Este
é um momento de muitos significados, especialmente pela gama de emoções
que se mesclam. Emoção dos que já usufruem e compartilham a grandeza
desta Casa pela chegada de mais um companheiro para partilhar desafios e
lutas experimentadas pelos que militam entre essas paredes que guardam
história e vida. Emoção de quem chega para integrar este grupo de
guardiões de um valiosíssimo patrimônio da história de Alagoas e do
Brasil.
Emoção
minha, pessoal. De quem, há exatos dois anos, estava nesta mesma
situação, quando fui agraciado pelo privilégio de adentrar nesta
Casa das Alagoas como sócio efetivo. Percebo, hoje, com muita
felicidade, que mantenho a mesma férrea vontade de oferecer o melhor de
mim, a contribuição modesta, mas autêntica, para a consecução do
ministério abraçado pelo nosso Instituto Histórico.
Emoção
particular pela honrosa missão de saudar este nosso novo confrade – meu
estimado amigo Eduardo Tavares Mendes – como o mais novo sócio do
Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas, preenchendo
a cadeira nº 57, do singular patrono Joaquim Inácio Loureiro e
anteriormente ocupada pelo querido e saudoso consócio José Sebastião
Bastos.
Eu e Eduardo Tavares somos de trajetórias profissionais diferentes, mas alicerçadas
na mesma identidade cultural e na mesma solidez de princípios e de
formação familial. Além de laços de família que nos aproximam, tivemos,
também, quase que ao mesmo tempo, a oportunidade de incursões no
universo jornalístico, ambos militando na Gazeta de Alagoas, outro
baldrame para o caminhar que depois trilharíamos, caminhar distinto, mas, como sói acontecer neste nosso querido torrão, as sendas daqueles que se dedicam ao mister público sempre se encontram, tal qual conosco aconteceu.
Mas
há algo que me aproxima sobremaneira de Eduardo Tavares Mendes: as
nossas origens. Somos ambos ribeirinhos, ambos sertanejos paridos juntos
às mesmas margens do Velho Chico,
de tanta afeição para nós. Eu venho de Pão de Açúcar e Eduardo de
Traipu. O Rio São Francisco tem para nós um significado especial. Nossa
terra, nossa gente, tudo começou e cresceu a partir do rio e em função
da majestade de suas águas. Essa é a expressão marcante que estará
sempre impregnada na nossa memória, pois para nós o velho Chico será sempre o nosso bravo “Opara”, o rio-mar cantado por Jorge de Lima, na sua belíssima “Rio de São Francisco”[Nota de rodapé]
[...] E o rio desce.
E um dia os riachos,
as torrentes,
as nuvens,
os outros rios vêm visitar o rio Opara.
E ele, para receber todas as águas
arreda as gentes das margens,
cresce,
corre rugindo nas pedras. [...]
Ele
nos une na doçura de suas águas e no despertar pela pungência vivida
por um rio outrora tão caudaloso e hoje sofrendo as consequências das
desastrosas intervenções humanas, como bem afirma o próprio Eduardo
Tavares no seu artigo “Rio de Lágrimas”, em que ele desabafa:
Para
o povo do rio, resta a esperança que nos faz sonhar com melhores dias
para tantas comunidades que dependem do seu vigor. Como gente da região,
resta-nos o consolo da solidariedade do sertanejo, da sua garra e do
seu destemor, o que nos faz afirmar, repetindo o cancioneiro popular,
que “em nossas veias corre sangue com areia daquele velho chão
caboclo”.
Esse velho Chico
irriga a terra árida e dá vida ao sertão, e também irriga a sociedade
alagoana, colocando-se como um celeiro de homens e mulheres com
trajetórias marcantes em vários e diferenciados campos, vindos das
terras que margeiam suas águas.
O nosso Instituto Histórico acolheu e acolhe muitos desses ribeirinhos[Nota de rodapé], patronos ou ocupantes de cadeiras no nosso sodalício. Da histórica e bela Penedo temos Teotônio Ribeiro e Silva, Antônio de Freitas Cavalcanti, Carlos de Barros Méro, Carmen Lúcia Dantas, José Damasceno Lima, Dom Adelmo Cavalcante Machado, Manuel Clementino do Monte, Ernani Otacílio Méro, José Próspero Caroatá, Elysio de Carvalho, Francisco Inácio de Carvalho Moreira – o Barão de Penedo – , Jurandir Gomes, Gilberto de Macedo, José Sílvio Barreto de Macedo.
Da minha querida Jaciobá, temos Francisco Henrique Moreno Brandão, quiçá nosso maior historiador; Luis Nogueira Barros, nosso Secretário Perpétuo; Olavo de Freitas Machado e a minha modesta pessoa. De Neópolis, a ribeirinha sergipana, temos Alexandre Dantas Cavalcante . Da airosa Piranhas, Rosiane Rodrigues Cavalcanti. Da bela Traipu, Luiz de Medeiros Neto, José Medeiros e, agora, o nosso novo e ilustre consócio Eduardo Tavares Mendes.
Eduardo vem de Traipu, corruptela de ityra-ipu, significando “olho d’água do monte”, a “fonte do morro”, homenageando o outro rio que banha o município, vindo de Pernambuco e que, descendo os morros, deságua no São Francisco.
Ao olharmos a belíssima trajetória de vida de Eduardo Tavares, podemos dizer que ele incorpora também o outro significado de ityra-ipu: “arrojado”.
Sim,
pois Eduardo coloca-se de forma arrojada no cenário da vida alagoana.
Graduado pela UFAL, com larga experiência no direito público e penal,
foi promotor, é procurador de justiça e, atualmente, Procurador-Geral de
Justiça do Estado de Alagoas. É vice-presidente do Conselho Nacional de
Procuradores-Gerais e teve destacada atuação à frente da Associação do
Ministério Público de Alagoas. Ocupou ainda a direção da Confederação
Nacional do Ministério Público para o Nordeste.
Sou
testemunha privilegiada do esforço e da dedicação que Eduardo Tavares,
no exercício da nobre missão de Procurador-Geral de Justiça, tem
dispensado para superar impasses próprios da gestão pública,
especialmente numa Alagoas prenhe de graves e complexos problemas.
Contrariando
a ideia trazida por suas posições vigorosas, Eduardo Tavares Mendes é
homem avesso à turbulência e que usa à exaustão o diálogo, a sobriedade,
a temperança, o comedimento. E sabemos todos que essas são as atitudes
que constroem, que somam.
Discípulo
de Pontes de Miranda, buscou no grande mestre a filosofia humanista que
norteia suas ações. Mas o nosso operador do Direito, a despeito do seu
estilo dialógico, como democrata que é, faz com muita firmeza o bom
combate, como dito por Paulo Apóstolo. Ao tempo em que age
com austeridade, exigindo e cobrando em nome da sociedade, da defesa da
ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais, Eduardo
Tavares vem demonstrando sua capacidade empreendedora, atuando em
várias frentes, fortalecendo a instituição mediante valorização dos seus
quadros, adequação de estruturas e efetiva inserção do Ministério
Público Estadual no mundo virtual, por diferentes meios.
Mesmo
sendo difícil eleger uma marca para descrever sua profícua gestão à
frente da Procuradoria-Geral de Justiça de Alagoas, destaco o que, a
olhos vistos, tem sido tão sobejamente exposto pelos seus próprios
pares: a harmonia interna,
a solidariedade, a independência entre os membros, o sentimento maior
de que, hoje, graças a esse congraçamento de princípios, o Ministério
Público de Alagoas é uma instituição efetivamente preparada para grandes desafios.
Minhas senhoras, meus senhores.
O
nosso novo consócio é, do mesmo modo, detentor de várias honrarias,
outorgadas por instituições da área jurídica e por outras organizações
da sociedade, nos revelando essa personalidade plural.
São inúmeras essas condecorações, não apenas no campo do Direito, mas em várias outras áreas, concedidas por
lídimas representações da sociedade civil e militar, reconhecendo os
serviços prestados pelo Dr. Eduardo Tavares a Alagoas e ao Brasil e nos lembrando da frase de Aristóteles: “A grandeza não consiste em receber honras, mas em merecê-las.”
Algumas
das distinções recebidas por Eduardo Tavares me chamaram
particularmente a atenção por revelarem uma face riquíssima deste nosso
novo consócio. Foram as comendas: “Escritor Olavo de Campos” da Academia Maceioense de Letras; “Escritora Heliônia Ceres” e “Jurista Silvio de Macêdo”, ambas do Sindicato dos Escritores do Estado de Alagoas; e “Dr. Volney Cavalcante Leite”da Associação Alagoana de Imprensa.
O
lado escritor de Eduardo Tavares Mendes não surpreende, já que todo
desafio a que ele se lança, o faz com competência e brilhantismo. A
grata surpresa vislumbra-se quando, por meio do seu olhar e da sua
verve, somos transportados por temáticas e questões do cotidiano da
nossa sociedade que nos levam a interessantes reflexões. Ao escrever, o
nosso confrade projeta-se para além da área jurídica, abordando aspectos
da política, da religião, das suas origens, da vida, enfim. Vê-se, rapidamente, que o nosso operador do Direito não espelhou-se apenas no Pontes de Miranda jurista, mas abeberou-se também do Pontes poeta, do Pontes humanista, do Pontes que ensina que
quem se contenta em ler apenas lei é um louco, um criminoso que o código esqueceu de enquadrar.
Eduardo
Tavares reúne e traz à discussão uma rica experiência acumulada não
apenas no seu múnus público, mas também como educador, com presença
marcante como Professor de Direito do CESMAC, Coordenador do Curso de
Direito e Diretor da Faculdade de Direito de Maceió, influenciando de
forma destacada na formação dos nossos bacharéis.
E sua escrita, essa vertente da sua inteligência, tem-se tornado pública nas páginas de nossos jornais e também no ambiente democrático da rede mundial de computadores. Encontrei no espaço virtual o “Duca Mendes” blogueiro[Nota de rodapé]. Um blog, como ele mesmo afirma, destinado à divulgação
“de artigos sobre vários temas publicados na imprensa de Alagoas, ao
longo dos anos, além de abrir um canal de comunicação com a sociedade”.
Demonstra, assim, nosso Procurador e consócio, que
o fato de estar colocado em um dos mais altos postos de poder no
Estado, que reclama uma postura de seriedade e sobriedade, não se
contrapõe à expectativa de um homem público, expondo sem medo suas
opiniões e suas ideias, explicitando conceitos e percepções,
caracterizando-se, assim, como homem do seu tempo, ligado nas mudanças e avanços da modernidade e também como um educador, que se coloca dentro da perspectiva apontada por Gadotti[Nota de rodapé], um dos maiores educadores brasileiros, quando afirma que
Não se pode imaginar um futuro para a humanidade sem educadores. [...] Eles fazem fluir o saber, não [apenas] a informação, o puro conhecimento, [mas]
constroem sentido para a vida das pessoas e para a humanidade e buscam,
juntos, um mundo mais justo, mais produtivo e mais saudável para todos.
(Grifo meu)
E o nosso “Duca Mendes” (já me atrevo a usar esse possessivo!) também carrega outra, por que não dizer, virtude, a de “singrar mares e rios”, seja a bordo do barco “Catarine”, quando em alto mar, seja a bordo do “Catita do Rancho”, quando navega nas águas límpidas do velho Chico, junto com seus familiares e amigos. Um hobby que, além do deleite que lhe proporciona, também faz com que mergulhe nas águas as vicissitudes dos inúmeros encargos do dia-a-dia.
Mas, meus amigos, foi
nos escritos de Eduardo Tavares Mendes que encontrei com clareza
cristalina as várias nuances do nosso novo consócio: embora prepondere a
sua atitude serena e equilibrada, algumas vezes ele cede à paixão, à contundência e à incisividade; em outras vezes, o percebemos tomado por pura emoção. Qualidades que se coadunam com aquilo que Vargas Llosa[Nota de rodapé]
diz intervir de forma determinante na criação literária, que alia o
exercício da “razão e da inteligência” a atributos como “a intuição, a
sensibilidade, a conjectura”.
Serenidade, equilíbrio e contundência se evidenciam quando analisa a atuação do Ministério Público em nosso País e enfatiza que se faz necessária a “pluralidade
de órgãos e agentes públicos na atividade investigatória, porque só
assim, com espírito republicano, poderemos dar segurança à sociedade
brasileira”. E
acrescenta que “não podemos esquecer que parte das dificuldades [do MP]
é consequência, também, das deficiências do aparelhamento judiciário,
da morosidade dos ritos, do medo das testemunhas, da burocracia e da má
formação policial”.
Ou ainda quando
fala da proximidade entre autonomia política e crescimento econômico,
focando uma questão recente e que acompanhamos de perto, que é a luta pela construção do estaleiro em Alagoas. Diz Eduardo Tavares:
O
trabalho, em sua dimensão ontológica, reproduz a cada dia a luta do
homem sobre a natureza por melhores condições de vida. Não sendo
materialmente possível suprir as demandas do consumo humano sem um
mínimo de interferência no meio ambiente, deve-se procurar o caminho do
desenvolvimento pela via da sustentabilidade, conceito no qual o homem é
a criatura central. [...]
Noutro artigo, ele coloca a política como arte e nos instiga a uma reflexão sobre essa realidade que nos envolve a cada dois anos, ressaltando que:
A
experiência adquirida em anos e anos de subdesenvolvimento, de
dificuldades e de desajustes impostos ao País, pode ensinar-nos a ter
uma participação mais efetiva na vida política do nosso vasto
território, cobrando, questionando, sugerindo e, sobretudo, escolhendo
governantes que tenham como meta prioritária o desenvolvimento, a paz e a
justiça social.
E
o nosso Procurador, adentrando por outros meandros, nos leva pelos
caminhos da fé e da tradição religiosa, descrevendo com cargas de emoção
a devoção por Nossa Senhora do Ó, padroeira da sua querida cidade:
A pequena Traipu [...] é rica em valores locais e universais e [...] a
religiosidade dos seus filhos é marcante. Lá, da colina sobre o rio São
Francisco, é Nossa Senhora quem exerce, realmente, a função de
protetora de toda aquela gente pacata e hospitaleira [...] que [...] tem
enfrentado, com altivez, com coragem e com força de vontade, todos os desafios da vida.
Minhas senhoras, meus senhores, amigas e amigos,
É para esse homem de aguçada sensibilidade, como demonstrado nesses meus breves destaques, que o Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas abre suas portas, extasiado por recebê-lo, especialmente porque todos aqui, coligados, temos a consciência cristalina do quão importante é tê-lo entre nós, meu caríssimo Eduardo Tavares. Do quão relevante serão seus aportes para que esta Casa se mantenha e se consolide cada vez mais como referencial da história e da cultura de Alagoas, e, também, como farol da sociedade no respeito aos princípios da ética, da moral, da honradez, da decência.
Pertencer a esta Casa representa a oportunidade de ser parte ativa deste que é
o terceiro Instituto Histórico e Geográfico mais antigo do Brasil; de
ser corresponsável pela guarda de tesouros seculares, como a Coleção
Arqueológica, cujas principais peças são oriundas da Região Amazônica; a Coleção Marroquim, cujo acervo foi colhido em território alagoano; a Coleção Etnográfica Indígena, com quinhentas peças; e a Coleção Perseverança, única no Brasil em sua amplitude relativa aos cultos afrobrasileiros e que marca o dramático e incomparável momento de intolerância religiosa sem igual no País, acontecido aqui em Alagoas.
Pertencer a esta confraria, num sentido mais abrangente do termo, representa poder compartir desígnios e interesses prazenteiros, por essa possibilidade de fraternal convivência e usufruto do saber e da experiência desse seleto grupo de homens e mulheres, reunidos sob a liderança do nosso querido Professor Jayme Lustosa de Altavila, que dirige esta Casa com expertise e cuidadoso apreço, sem perder a perspectiva do momento, da contemporaneidade, da vida que pulsa fora dessas paredes.
Por isso, meu estimado Eduardo Tavares Mendes, o recebemos com muito júbilo. Seu pertencimento a este Instituto lhe faz um especialíssimo companheiro na missão que abraçamos. Uma missão que não se exaure, que nos acompanha e nos envolve, que estabelece um
vínculo que, se um dia lhe pareceu distante, foi-se achegando a cada
dia, seduzido pela sua brilhante trajetória e, de agora em diante, não
mais fenecerá, como tão bem nos evoca o grande Ledo Ivo ao cantar “A beleza da terra”[Nota de rodapé]:
Longe mudado em perto, como todos
os longes verdadeiros.
Ó longe que é da terra, como em pão se mudam as farinhas.
Existo na distância, e meu olhar
bebe a sombra de lua e invernias.
MUITO OBRIGADO!