quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Discurso: Solenidade de posse como sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas (IHGAL). 14.11.12

      
    É com imensa alegria que tomamos posse, nesta oportunidade, como membro efetivo deste prestigiado e tradicional Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas, na qualidade de titular da cadeira nº 57, patroneada pelo jornalista e educador Joaquim Inácio Loureiro e ocupada, até o ano recém-findo, pela figura ímpar do desportista José Sebastião Bastos.
    O ingresso neste sodalício deixa-me não só muito feliz como profundamente honrado: não bastassem as relevantes finalidades do Instituto na seara da História, da Geografia, da Arqueologia e da Antropologia, as grandes personalidades que aqui estão e que por aqui passaram revelam a grandeza desta Casa mais do que centenária de que agora faço parte.
    Cito, apenas para exemplificar, os nomes de Silvério Jorge, Dias Cabral, Medeiros Neto, Diegues Júnior, Osório Gatto, Anfilófio Jayme de Altavila , Demócrito Gracindo, Hélio Cabral, e tantos outros que, a partir de sua instalação, em 02 de dezembro de 1869, sob a coordenação do 33o Presidente da Província das Alagoas, José Bento da Cunha Figueiredo Júnior, até tempos recentes, nos legaram a missão e o papel de guardiões da cultura e da memória das Alagoas.
    Quero salientar aqui a importância da História como ciência e instrumento de pesquisa para o desenvolvimento da sociedade humana. O crítico literário Jean-Didier Wolfromm lembrou que
    nossa curiosidade sobre as coisas do passado não tem fim. Jamais nos sentiremos saciados de saber se era antes, de outro modo ou noutro lugar, que deveríamos ter nascido.
    Penso ser inaceitável hoje conceber a História apartada da Filosofia. O intenso desenvolvimento das ciências sociais no século XX, reflexo dos novos paradigmas metodológicos criados pelos filósofos do Iluminismo e pelos pensadores alemães dos séculos XVIII e XIX, propiciou esse encontro fundamental.
    Dentre esses pensadores impende citar os nomes de Immanuel Kant, Hegel e Karl Marx. Esses gigantes do pensamento universal transformaram o estudo da História, antes vista como um simples relicário de fatos, datas e nomes, em uma ferramenta para a compreensão das “leis ocultas” que movem os passos da civilização.
    Não existe nada que não tenha a sua história: o homem é um ser histórico na sua dimensão social, e ao mesmo tempo em que constrói a sua história, ele é por ela constituído como sujeito de fato e de direito.
    O historiador, no marco do conhecimento moderno, deixou de ser um observador contemplativo dos movimentos sociais, dedicado à mera descrição de uma dada sucessão de fatos, para tornar-se o analista credenciado das relações de poder que condicionam esses fatos e os dispõem em uma sequência quase inevitável.
    O mundo avança por caminhos traçados de acordo com uma geometria política regida por leis dificilmente contornáveis.
Não estou a defender o determinismo histórico. Mas a reconhecer que, embora não seja sujeito passivo dos acontecimentos, o ser humano não influi, enquanto indivíduo, no curso das grandes narrativas. As grandes narrativas humanas dependem de fatores materiais, políticos e econômicos que seguem uma lógica própria até se esgotarem pela dinâmica das necessidades emergentes.

Acerca dessa questão, Marx registrou, com lapidar proficiência, que Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas legadas e transmitidas pelo passado.

Fazer história” não significa apenas documentar acontecimentos grandiosos ou escrever páginas laudatórias a respeito dos “grandes vultos” do passado, mas identificar, na marcha das gerações e de suas instituições (Estado, Família, Direito, Religião, Educação, Mercado etc.), os sinais dos processos de mudança e os mecanismos que os alimentam.

Estimulados por essa contextura epistemológica, torna-se razoavelmente fácil responder a indagação posta pelo historiador Voltaire Schilling: (???)“É possível extrair-se algum sentido dessa sucessão de guerras, de grandes confrontos bélicos, de destruição de templos e cidades inteiras, [...], do desaparecimento de antigas e da emergência de novas civilizações que marcaram a história da humanidade???” Direi que sim, que a História tem a sua lógica, e compreendê-la implica a formulação de um método apto a penetrar o âmago do discurso civilizatório.
    O objeto da História é a cultura. O pesquisador deve debruçar-se sobre a cultura para entender o fluxo das mutações gerais dentro de uma dada formação social em uma determinada época.
    Para cumprir bem o seu papel, o historiador precisa munir-se de um método compatível com o objeto que ambiciona desvelar: (???)como saímos da pré-História para a comunidade primitiva? (???)E desta para o escravismo, cumprindo diversas etapas até chegar aos dias de hoje, na emergência da globalização?
Estudar a história não significa registrar o que os homens fizeram, mas compreender as engrenagens criadoras das circunstâncias que deram homens como aqueles, com suas ideias e visões do mundo, em seu tempo e espaço próprios, e os levaram a agir exatamente como agiram.
Trata-se, no caso, das chamadas “fontes históricas”, cujo estudo, interpretação e sistematização podem levar, por dedução, a novas teorias da História. Prova da existência de leis que regem a aventura humana podemos encontrar no fato de que o passado não se repete, ou não se reproduz, salvo como tragédia ou como farsa, como escreveu o pensador alemão Karl Marx.

História, Filosofia e Política são disciplinas autônomas, é bem verdade, mas atuam no campo das ciências sociais e compõem a grande trilogia do tempo, atuando em permanente e recíproco vir-a-ser. Todas elas têm seu método específico, mas, ao modo dos galhos de uma árvore, constituem o tecido capilar por onde a seiva do conhecimento flui e irriga a vida dos grupos humanos.

As ciências naturais cuidam dos problemas da existência com os vastos recursos do método experimental, que as impregna de uma noção de certeza quase matemática.

A Física newtoniana conseguiu desvendar, no século XVII, as regras até então misteriosas do funcionamento do Cosmo. Kant, o filósofo indispensável, na busca de aproximação entre as ciências do espírito e o conhecimento empírico, edificou as bases da Filosofia da História no século seguinte, com vistas a pesquisar cientificamente os fenômenos mundanos à luz do racionalismo cartesiano, na conformidade da síntese “Penso, logo existo”. Uma filosofia, portanto, de inspiração racional, porém configurada no ideal metafísico que conduz tudo que existe à Razão Suprema, isto é, a Deus.
    Ele concebeu um modelo racional de História que se volta para o passado para compreender melhor o presente e o futuro.
    Um modelo eminentemente hermenêutico, cuja noção de verdade e de certeza está sempre exposta à crítica.
    Nessa cosmovisão, a História seria o meio necessário mediante o qual a humanidade alcançaria a ordem absoluta, porque as leis que regem o mundo são universais e se dirigem à realização do ideal de progresso com ordem e segurança.
    No século seguinte, Marx trabalhou conceitos novos, identificados com a doutrina do materialismo dialético. Era imperioso resgatar o nexo causal entre os fatos históricos e os seus antecedentes políticos e econômicos, expondo esses fatos a fenômenos como produção, mercado, capital e o que chamou de “luta de classes”.
    Antes dele, Hegel, influenciado pelas ideias de Rousseau e Kant, desenvolveu a noção relacional entre a mente e a natureza, entre o sujeito cognoscente e o objeto cognoscível. De suas lucubrações chegou ao postulado de que “a mente manifesta-se em um conjunto de oposições e contradições”, que só se resolvem pela superação de uma força – tese – por outra – antítese – na construção da síntese, que representa um avanço sobre o estágio anterior. E por aí segue a História...
Este sistema, matriz do raciocínio dialético desde a Antiguidade Grega, foi aperfeiçoado por Hegel, em um primeiro momento, e depois por Marx, e constitui a própria substância do conhecimento da História que, nesse outro nível teórico, pode servir como instrumento de conscientização dos homens para a tarefa científica de construção de um mundo melhor.

A propósito do tema, parece-me de interesse explicitar a relação existente entre certas conjunturas políticas e sociais com o aparecimento de ideias científicas e de personagens da Filosofia que marcaram os quatro mil anos da civilização.
    Sobre esse pano de fundo, o pensador franco-argelino Louis Althusser nos apresentou, em livro de 1971, uma conjunção de acontecimentos políticos e científicos representativos de modificações importantes da conjuntura política, social e econômica anterior.
    Ele nos lembrou que a constituição do Império Macedônio, que coincide com o fim do sistema de governo das cidades gregas, vem acompanhada da ideia de uma ciência biológica atrelada às concepções de Aristóteles.
    A constituição do Império Romano escravista seguiu a ideia de uma nova Física e testemunhou o nascimento da doutrina dos estoicos. Por outro lado, o desenvolvimento das relações jurídicas mercantis sob a Monarquia Absoluta, no século XVIII, emoldurou a Física de Galileu Galilei e o pensamento de René Descartes.
    Do mesmo modo, a ascensão da burguesia após a Revolução Francesa alinhou-se à refundição da Física por Newton e às ideias de Kant.
O cientista britânico Eric Hobsbawm, já citado, jamais escondeu suas preocupações de, enquanto historiador, “aprimorar as análises históricas para criar mecanismos mais eficientes de predições econômicas e sociais”.
    Destaco, agora, o papel do historiador que retira e preserva os tesouros do passado, interpreta a história e aprofunda sua consciência sobre a realidade presente, ajudando o homem a refletir sobre a condição humana e a transformá-la em seu benefício.
    Refiro-me ao historiador que, na qualidade de um autêntico cientista, colhe dos fatos sua essência, isto é, as leis internas de seu desenvolvimento e as oferece ao mundo político, a quem cabe operar as mudanças que a sociedade tanto reclama. Este é o começo daquilo que Dany-Robért Difú chamou de “grande narrativa libertadora”.
Convém observar, por oportuno, que a ligação com o cotidiano tem tornado a História cada vez mais fascinante para o homem comum, interessado em comparar o mundo moderno com a realidade de décadas e séculos atrás e, a partir daí, extrair elementos de cognição que lhe permitam avaliar se estamos avançando em áreas tão sensíveis como a dos direitos humanos, das liberdades públicas e da democratização do exercício do poder de Estado.

Além de se empenharem na compreensão dos mitos, das guerras, dos governos, da política, dos santos e dos heróis, os historiadores começam a pesquisar a história do medo, do corpo, da moeda, da arte, da indumentária, da escrita, das línguas, enfim, dessa miríade de fatos do cotidiano, dando ensejo à criação de novos campos de pesquisa em setores como a paleografia, a numismática, a estética, a filologia e a etnologia.
A história já registrou grandes rupturas nos tempos mais recentes, vale dizer, da Idade Média à Contemporaneidade, e a cada ciclo novas rupturas surgem. O escravismo foi substituído pelo feudalismo, que teve sua origem na decadência do Império Romano e se caracterizou por relações de produção de servilismo, baseadas na propriedade privada da terra e na economia sem comércio. Ao feudalismo se seguiu o capitalismo.
    Em 1917, trabalhadores urbanos e camponeses russos protagonizaram uma revolta armada de massa e tomaram o poder da monarquia czarista, implantando o fim da propriedade privada dos meios de produção, inclusive a terra, e a economia planificada.
    Mais do que uma simples ruptura, uma verdadeira revolução político-social que levou à derrocada das estruturas semifeudais do país e se autoproclamou socialista.
A experiência vivida pela ex-União Soviética, liderada pela Rússia, durou 74 anos até implodir, em 1991, diluindo-se na tempestade da Glasnost e da Perestroika de Mikhail Gorbatchev.

O que parecia sólido tornou-se fluido: o socialismo soviético não passou de uma miragem e, portanto, desvaneceu-se. Com o fim do socialismo no gigante eurasiano, o cientista político Frencis Fukayama prognosticou o “fim da História”: no seu entendimento, a inexistência de uma força antagônica ao capitalismo tornava a História irrelevante.
Ledo engano! Vivemos hoje uma realidade na qual o capitalismo, corroído por frequentes crises estruturais e cíclicas, não tem se mostrado capaz de concretizar as esperanças de uma população que, aqui e alhures, aspira a remodelar o mundo e a torná-lo um lugar mais digno para todos.

E o que temos hoje? O poder econômico toma conta de tudo; o capital não tem pátria nem compromisso social: não respeita a liberdade das minorias, a diversidade cultural, a autodeterminação dos povos, os direitos humanos nem o meio ambiente.
    Temos que nos preocupar com o nosso planeta, com a vida em todas as suas formas e manifestações.
        O ex-Primeiro Ministro da extinta União Soviética, Mikhail Gorbachev, afirmou: “Com toda a diversidade de sistemas sociais e políticos, este mundo é um só. Somos todos passageiros a bordo de uma nave, a Terra, e não podemos deixar que ela naufrague. Não haverá uma segunda arca de Noé”.
A natureza é, na verdade, o útero do qual saímos todos, e a humanidade dela se afastou pela cultura; mas ao seu regaço um dia voltaremos, como filhos pródigos e, talvez, como filhos ingratos também.
    Ninguém mais ignora a simbiose existente entre a Geografia e a História.
    A Geografia, enraizada na ampla descrição dos aspectos físicos do mundo e de sua impressionante variedade cartográfica, constitui-se em ciência da compreensão de uma paisagem global do tipo homem-território.
    Conquanto forte no aspecto exterior da Terra, a Geografia deve unir o natural e o social e promover uma prática humana que nos leve ao conhecimento mais profundo da relação entre o homem e a natureza.
    Deve ser vista como espaço destinado a abrigar as interações do domínio orgânico com o inorgânico, do ser humano com os demais âmbitos da natureza (a biosfera, a atmosfera, a litosfera e a hidrosfera) e a promover uma visão humanística sobre toda a complexidade biofísica do mundo.
    As modernas tecnologias da informação estão literalmente diluindo as fronteiras estatais: o que se passa na China distante chega às mais diversas regiões do planeta com uma imediatidade meteórica.
    As empresas multinacionais se expandem com voracidade, o que reduz Estados nacionais a simples sucursais de uma rede corporativa transnacional que controla a economia globalizada.
Esses novos fenômenos geopolíticos e econômicos impõem desafios àqueles que desejam se aprofundar no conhecimento do que se passa no mundo atual. É nesse instante que percebemos a importância do estudo integrado da história com a geografia, do tempo com o espaço, para concluir sobre a impossibilidade de uma história sem geografia ou de uma geografia sem história.

Abro agora um largo parêntese para falar sobre o Direito. Como homem da ciência jurídica, tenho estudado a história do Direito no mundo e, em particular, no Brasil.

Dentro desse estudo, tenho me aprofundado na pesquisa sobre a história da justiça e do Ministério Público Brasileiro, Instituição da qual faço parte e que tantos e tão relevantes serviços tem prestado à nossa sociedade.

Entre nós, o surgimento de uma instituição parecida com o Ministério Público se deu com o Tribunal da Relação, na Bahia, quando foi criada a figura do Procurador dos Feitos da Coroa e da Fazenda e Protetor dos Interesses dos Órfãos e das Viúvas, isso no ano de 1609.
    Daí dizer-se que o chamado parquet brasileiro tem 400 anos de existência. Começou a surgir ali o primeiro traço do que viria a ser o Ministério Público da atualidade, uma Instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado.
    Entidade autônoma, una e independente, promotora da justiça social, vocacionada à defesa do regime democrático e dos direitos mais elementares da sociedade, tem sido, ao longo dos anos, um sustentáculo da Constituição republicana e da justiça.
Dessa forma, o Ministério Público vem fazendo a sua hora, influindo na história do Brasil, mudando rumos equívocos e ajudando a promover o aprimoramento social, a ponto de ser considerado hoje a grande esperança do povo sofrido e espoliado deste Pais de tantas iniquidades.
Com esse discurso, quero ratificar a minha disposição de aprofundar os estudos sobre essa Instituição que vem a ser uma das mais importantes do mundo na atualidade e que tem como uma de suas mais sublimes missões reduzir o grande fosso que, em pleno século XXI, ainda existe entre a nação e o Estado, entre o povo e o poder público.
Espero, sinceramente, contar com o inestimável apoio de meus ilustres pares, mormente daqueles oriundos do Ministério Público, para dar cobro a essa edificante tarefa.

A nossa grande missão como cidadãos da era tecnológica vem a ser o aprimoramento político e social da nação brasileira. “Nada mais prejudicial para uma nação”, dizia Bismarck, “que os seres humanos espertos serem considerados sábios”.

Apesar do uso predatório da tecnologia, da suspeitíssima política nuclear disseminada nos cinco continentes, das guerras que eclodem por toda parte, dos genocídios, das constantes agressões aos direitos humanos, apesar da fome que se abate sobre boa parte dos países da África, da Asia e das Américas Central e do Sul, ainda acredito no homem. Sou um otimista porque sou um homem de fé, e o otimismo é a fé em ação.

Senhoras e senhores. Senhor presidente,
Honra-me, digo mais uma vez, fazer parte desta Instituição, onde militam uma plêiade de mulheres e homens tão importantes como as senhoras e os senhores, todos baluartes do saber, e alguns, no meu sentir, lendas vivas da cultura alagoana, como Milton Hênio, Marcos Melo e Jayme de Altavila.
Enalteço aqui o papel da mulher pesquisadora, historiadora, geógrafa, escritora, poeta, musicista, gigantes da nossa cultura e, nesse passo, saúdo as intelectuais Teomirtes Barros, Selma Brito, Solange Chalita, Venúsia de Barros Melo, Rosiane Rodrigues, Carmem Lúcia Dantas, Silvana Quintela Cavalcante, Maristher Moura Vasconcelos, Nádia Fernanda de Amorim e Ângela Maria Canuto.

Dizem que os homens conquistaram o mundo, mas. Com certeza foram as mulheres que o proveram de beleza, de vida, de amor e de paz.
Paz é o grande tema da atualidade. Ela está no cerne da busca ingente do cidadão, dos povos civilizados, dos juristas, dos cientistas, e cabe aos historiadores estarem atentos a essa grande jornada humanitária e planetária, acompanhando, registrando, para que um dia possamos afirmar que o Sumo Pontífice João XXIII estava certo quando dizia: “Justiça é o novo nome da paz”. Plantemos justiça, pois, e colhamos a paz.
Senhor Presidente.
É motivo de muita satisfação falar agora sobre o grande alagoano Joaquim Inácio Loureiro, professor, político e jornalista, patrono da cadeira 57 deste Instituto. Seus atributos morais e sua inteligência são características que o fizeram um dos homens importantes desta terra no campo das letras, do magistério, da política e do jornalismo, conforme depoimentos de seus contemporâneos.

O mestre Loureiro nasceu na zona rural, mais precisamente no sítio Campo Grande, na antiga cidade de Alagoas, hoje Marechal Deodoro, no dia 30 de outubro de 1846. Seus pais, Joaquim Inácio Loureiro e dona Francisca Inácio Loureiro, muito o incentivaram a iniciar a sua caminhada através do magistério

Com apenas 16 anos de idade, começou a ensinar. Em agosto de 1861, participou de um concurso em que foram examinadores os professores José Alexandre Passos, Camilo de Sales Pereira e José Antônio Bahia da Cunha, conhecidos por agirem com austeridade e com rigor em certames daquela natureza. Aprovado, foi nomeado professor vitalício na cidade de Matriz do Camaragibe.

Em seguida, passou a lecionar na Barra de São Miguel, onde contraiu núpcias com dona Maria da Graça Pereira Loureiro, filha do português José Pereira dos Santos, capitão marítimo.

Desenhavam-se, ainda no início de sua juventude, os traços do grande mestre que Joaquim Loureiro viria a ser, “tendo se apropriado de novos métodos e de mais acrescentados conhecimentos, por força de lições obrigatórias e no trato com mestres experientes”, nas palavras do jornalista Augusto Vaz Filho em livro dedicado aos alagoanos ilustres.

Em novembro de 1871, foi nomeado Tenente do Batalhão de Reserva da Guarda Nacional. No ano seguinte, designado para dirigir a Escola Noturna de sua terra natal, permaneceu no cargo até 1874. Passou pelo Pilar, voltou para Camaragibe e de novo esteve em Alagoas (Marechal Deodoro), tendo sido removido posteriormente para Maceió.

Joaquim Inácio Loureiro fez parte da Escola Superior, anexa ao “Pedagogium”, que era uma espécie de senado de professores, de todo corpo docente do Estado, onde se discutiam as teses e práticas de interesse direto da instrução pública.

Em 1892, o Professor Loureiro foi nomeado lente de latim do Liceu alagoano, passando em 1894 a reger a cadeira de Escrituração Mercantil, onde permaneceu até novembro de 1896, quando se aposentou com 39 anos de serviço público.
O professor Joaquim Inácio Loureiro notabilizou-se, também, como político e como jornalista. Aurino Maciel observa que “onde quer que estivesse, foi o professor Loureiro dono de uma importante e vibrante pena a serviço do Partido Conservador.

O professor Loureiro foi um dos mais destacados jornalistas do seu tempo, sobressaindo-se não somente pelas atitudes desassombradas, mas também pelo estilo correto e brilhante dos seus artigos, tendo sido reconhecido como um argumentador provido de espírito culto e poder de síntese. Seus escritos eram claros, concisos e profundos, diziam os críticos da época.

Falecido em 1920, o professor Joaquim Inácio Loureiro dignifica a cadeira por ele inaugurada e que doravante tenho a honra de ocupar.

Senhor Presidente, minhas Senhoras, meus senhores,

A cadeira nº 57 deste venerável Instituto, na qual passo a ter assento, pertenceu ao ilustre jornalista, desportista, advogado e homem público José Sebastião Bastos, seu segundo ocupante.

“Bastinho”, como era popularmente conhecido, sucedeu na cadeira o Monsenhor José Luís Soares em 1999 e, no Parecer lavrado pela Comissão de admissão de Sócios que apreciou sua candidatura, consta que ele possuía “um currículo profissional bastante expressivo”, o que pode ser comprovado pelo rico acervo de cargos, funções e atividades públicas e privadas que exerceu durante sua profícua existência. Senão vejamos.

José Sebastião Bastos nasceu no dia 02 de dezembro de 1922 no bairro operário de Fernão Velho. Filho de Sebastião Bandeira Bastos e Maria Adalgisa Bastos, fez o curso primário no Grupo Escolar Cincinato Pinto, situado na Rua General Hermes, no bairro do Bom Parto. Neste ponto vale a pena registrar uma interessante coincidência: o local onde se ergueu aquela unidade de ensino foi o mesmo que serviu de residência ao ilustre jurista Jayme de Altavila, pai do atual presidente desta Academia, e que viria a ser professor de “Bastinho” no vetusto Lyceu Alagoano e, mais tarde, na Faculdade de Direito.
“Bastinho” teve uma breve experiência política em seu currículo, como vereador pelo município de Maceió na legislatura de 1951 a 1955. Foi jornalista e dirigiu o “Jornal de Hoje” durante 18 anos.
Entre as atribuições que abrilhantam a sua colorida biografia constam as de presidente da Federação Alagoana de Desporto, presidente do Conselho Regional de Desporto; conselheiro da Ordem dos advogados do Brasil; presidente da Federação das Colônias de Pescadores de Alagoas; vice-presidente da Campanha Nacional de Escolas da Comunidade, conselheiro da Fundação Teatro Deodoro; conselheiro da Empresa de Recursos Naturais de Alagoas; conselheiro da Fundação Alagoana de Promoções Esportivas, a FAPE e diretor da Confederação Brasileira de Futebol, a CBF; Sua dedicação ao esporte foi notável, e as múltiplas atividades que desempenhou em Alagoas e no Brasil falam por si sós.
Na esfera pública, além de sua passagem pela Casa de Mário Guimarães, exerceu os cargos e funções de Inspetor de Educação do Município de Maceió, de comandante da Guarda Civil; de diretor do Departamento Estadual de Educação; de chefe de gabinete da Secretaria de Educação e Cultura do Estado de Alagoas; diretor administrativo do Serveal, Serviço de Engenharia do Estado de Alagoas, dentre outros.

José Sebastião Bastos prestou diversos e relevantes serviços à sociedade alagoana e brasileira, como pudemos constatar, e por isso foi alvo de inúmeras e merecidas homenagens.
    Em uma de suas saudações ao velho amigo o radialista Lautheney Perdigão nos bridou com uma pérola de sua conhecida verve, ao registrar episódios pitorescos da vida de “Bastinho”. A certa altura, escreveu:
    Na vida de nosso personagem aconteceram coisas incríveis. Foi presidente da Federação Alagoana de Desportos sem nunca ter chutado uma bola. Foi Comandante da Guarda Civil sem ter sido militar. Foi diretor administrativo do Serviço de Engenharia do Estado sem nunca ter sido engenheiro. Foi presidente da Colônia de Pescadores sem nunca ter lançado um anzol...”.
    Era essa a marca da personalidade inquieta de “Bastinho”, um homem versátil, inteligente, pragmático e realizador, que deixou para todos nós o legado de sua humildade e o amor à vida e ao trabalho.
Senhoras, Senhores, Senhor Presidente:
A esta altura, Peço vênia aos meus ilustres pares e à distinta plateia para fazer um breve relato de minha trajetória, toda ela vivenciada em nossa querida Alagoas.

Nasci na ribeirinha Traipu e criei-me brincando entre as caatingas e velejando nas águas caudalosas do Rio São Francisco , o “Velho Chico”. E sobre o Velho Rio, quero falar um pouco:

Como um amante da natureza, reafirmo aqui o que venho dizendo ao longo dos últimos anos nos congressos de meio ambiente de que tenho participado: estão matando o “Velho Chico”, onde canoas de “tolda” e grandes embarcações, como a “Tupi”, a “Tupiji” e a “Tupã”, agora só existem na lembrança dos tempos das enchentes.

Nas feiras, abundavam os frutos do generoso rio, os “mandins”, os “surubins” e os “carás”, ocasião em que a “Velha Candelária” unia os povos ribeirinhos, transportando seus pertencentes, contando suas histórias e louvando o seu folclore.

“As barragens e o desmatamento das cabeceiras”, escrevi em artigo publicado na imprensa local, “tem sido os maiores responsáveis pelo enfraquecimento do rio, outrora pujante, que, da maneira como se encontra, já não é mais o soberbo “Rio da Unidade Nacional”, pois perdeu a exuberância das águas, a força das correntezas, a vaidade de sua beleza, a imponência das velas, o desfile das saudosas “chatas”...

Senhor presidente, minhas senhoras, meus senhores, meu caro amigo e beiradeiro Álvaro Machado, a execução das obras da transposição das águas do São Francisco, ainda que para abastecer outros rios, faz-nos refletir e recorrer ao ensinamento contido em uma frase que encontrei casualmente algures, de autoria desconhecida, que proclama:
Mais vale preservar uma gota d' água que seja do São Francisco, hoje, do que chorar uma lágrima por ele amanhã, mesmo que sincera.”

Voltando a Traipu

Faço um retorno mental à minha querida Traipu. (???)A política da época? Desprovida de violência! De relevante o fato de que, quando o chefe político Gonçalo Tavares, meu avô, ascendia ao poder municipal, a feira descia para a Rua de Baixo, onde ele mantinha o seu estabelecimento comercial. Quando, todavia, o outro chefe político, Afonso Freitas, assumia o poder, a feira se instalava na Praça de Cima, simbolizando, geograficamente, a força política que mandava no município, na ocasião.

Cursei o primário no Grupo Escolar Moreno Brandão (…...) Já adolescente, mudei-me para Capital, onde fiz a segunda parte do curso médio, então conhecido como curso ginasial.

Ainda adolescente, passei a trabalhar na sucursal da Gazeta de Alagoas, em Palmeira dos Índios, onde concluí o curso científico, última etapa do curso médio. Na “Princesa do Agreste” nasceram os meus filhos mais velhos, Cristiano e Eduardo. Minha permanência em Palmeira dos Índios foi um aprendizado cotidiano. Detinha prestígio enorme, pois era gerente da Gazeta de Alagoas e, como tal, mantive estreita convivência com homens como Luiz B. Torres e Valdemar de Souza Lima. Com este, percorri vários municípios alagoanos, acompanhando-o em suas pesquisas sobre “Lampião” e seus cangaceiros.

Prestei vestibular para o curso de Direito e, assim, mudei-me novamente para esta Capital, passando a estudar na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Alagoas, sem prejuízo do vínculo com o jornal “A Gazeta”, além de trabalhar no Jornal de Hoje e no Tribunal de Contas do Estado.

Antes de concluir o Curso de Direito, fui eleito Vereador em minha terra natal, tendo ocupado a vice-presidência da Câmara Municipal. Assumi a direção do Jornal de Hoje pouco tempo depois. Em Palmeira dos Índios, fundei a “Gazeta do Sertão” (….). Fui diretor de escola cenecista e, finalmente, ingressei no Ministério Público estadual, onde estou há mais de 25 anos.

Trabalhei em diversas comarcas do Estado como promotor de Justiça e, ao ser finalmente promovido para a Promotoria do júri, aqui em Maceió, passei a exercer o magistério, lecionando as disciplinas Direito Penal e Direito Processual Penal na Faculdade de Direito de Maceió, Fadima, no Tribunal de Justiça, na Escola Superior do Ministério Público e na Ordem dos Advogados do Brasil. No Cesmac, logo fui escolhido vice-Diretor e coordenador da Faculdade de Direito, sendo depois eleito Diretor, funções que exerci por mais de 15 anos.

Ao lado de todas essas atividades exercidas no magistério superior e no Ministério Público, fui eleito tesoureiro, vice-presidente e quatro vezes presidente da Associação do Ministério Público de Alagoas, tendo sido escolhido, na oportunidade, vice-presidente da Confederação Nacional do Ministério Público – a CONAMP.

Em novembro de 2008, participei da eleição para escolha do Procurador-Geral de Justiça do Ministério Público estadual, tendo sido o candidato mais votado e, em seguida, nomeado pelo Governador Teotônio Vilela Filho para dirigir os destinos da Instituição em duas gestões. Nesta última, exerci durante um ano o honroso cargo de vice-Presidente do Conselho Nacional de Procuradores Gerais do Brasil para o Nordeste.
    Creio que dei a minha contribuição, como chefe do Ministério Público, ao processo de aprimoramento político e social de Alagoas. Consolidei amizades e aprendi muito. As pessoas de Teotônio Vilela Filho e Álvaro Machado foram fundamentais, dentre outras, nesta quadra de minha caminhada.
              Se êxito tive, devo atribuí-los a estes fatores: a obstinação, pois sempre fui um obstinado; às amizades, porque sempre as cultivei; à vocação, porque me sinto um vocacionado; mas também à humildade e ao meu modo singelo mas firme de encarar os desafios com ética e seriedade e, sobretudo, com soladariedade. Penso que o ser humano jamais deve olhar uma pessoa de cima para baixo, a não ser para ajudá-la a levantar-se.

Reconheço, acima de tudo, como de fundamental importância para a minha caminhada, o apoio recebido da família querida que Deus pôs ao meu lado.: da minha esposa Catarine e dos meus filhos todos, dentre eles um pesquisador de apenas 08 anos de idade, apaixonado por história, apaixonado por geografia, escritor e compositor, Luiz Eduardo.

Finalmente, senhor presidente, quero concluir a minha fala afirmando que pertencer aos quadros do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas tem se constituído em uma das minhas mais importantes realizações. É mais uma porta que Deus abre em minha vida, alargando os horizontes de minha trajetória e permitindo que com os sentimentos da paixão e da esperança, eu possa continuar contribuindo para o crescimento do Estado de Alagoas.